Afinal, qual o problema de usar dinheiro em espécie? - migalhas
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Nas últimas semanas a mídia tem noticiado o dispêndio de vultosos valores em imóveis por integrantes da família Bolsonaro - apelidados de "clã Bolsonaro". Tais movimentações
levantam suspeitas pelo fato de que, pelo o que consta, teriam sido realizadas com o uso de dinheiro em espécie. Desta forma, considerando-se que o aprimoramento dos instrumentos bancários
de transferência de valores foi notavelmente acelerado nos últimos anos - em boa parte devido à pandemia de Covid-19 -, o papel moeda teve sua circulação reduzida à poucas operações
rotineiras e, no mais das vezes, em pequenos valores. Nesta linha, as operações financeiras com o uso da moeda em pecúnia é, de fato, um comportamento que levanta suspeitas quanto à sua
licitude, notadamente porque a maior parte da movimentação financeira no mercado paralelo é feita com valores em espécie. Portanto, é importante que reflita acerca das implicações criminais
que podem ocorrer no uso da moeda corrente em sua forma primitiva, sobre as quais paira a suspeita de destinação para lavagem de dinheiro havendo, inclusive, atos administrativos dos órgãos
reguladores a respeito de saques de elevados montantes em agências bancárias ou lotéricas. Sabe-se, contudo, que a utilização da moeda corrente em dinheiro possui vantagens implícitas,
muitas das vezes ligadas à práticas ilícitas de evasão fiscal - quando o agente não deseja declarar o capital, por exemplo -, ou simplesmente para obter descontos em estabelecimentos
comerciais. Todavia, comprar bens com valores em espécie é uma prática que a muito tempo vem atraindo a atenção dos órgãos dedicados à prevenção da lavagem de dinheiro, como é o caso do
Banco Central do Brasil (BACEN). Deste modo, o BACEN edita regularmente cartas circulares que exemplificam situações que podem conter indícios de lavagem de capitais, as quais devem ser
informadas ao Conselho de Controle de Atividades Financeiras (COAF) pelas entidades obrigadas à comunicação compulsória, como é o caso da Carta Circular 4.001/20, a principal norma a
respeito do tema. Apesar das críticas dirigidas as cartas circulares do BACEN, fato é os cartórios tem dominado o ranking de comunicações feitas ao COAF, sendo a "Comunicação de
Operação em Espécie (COE)" a mais comum, fator este que pode indicar o atrativo do mercado de compra e venda para a prática de lavagem com valores em pecúnia. À vista disto, o projeto
de lei 3.951/19, de iniciativa do Senado Federal, pretende estabelecer limites para o uso de dinheiro em espécie nas operações comerciais, definindo patamares de uso diário de R$5.000 para
algumas negociações, objetivando evitar o uso de dinheiro físico com finalidades ilegais, como impedir o rastreamento da transação ou, até mesmo, a própria lavagem. Sabe-se, portanto, que a
movimentação de dinheiro em moeda é uma prática que realmente chama a atenção para a possível ocorrência de uma infração penal que afeta a todo o sistema financeiro nacional, sendo coerente
que haja a preocupação dos órgãos fiscalizadores acerca de seu uso totalmente desvigiado. Entretanto, é certo que esta forma de uso da moeda corrente não é, de forma alguma, por si só
caracterizada como crime, nem tão pouco como ilícito fiscal, sendo um meio de movimentação que muitas das vezes beneficia a ambas as partes de uma operação comercial - até pela
desnecessidade de arcar com elevados custos relacionados à movimentação bancária.